terça-feira, 24 de maio de 2011

Pistolagem no sudeste do Pará



Casal estava sendo ameaçado de morte e na manhã desta terça-feira (24), dois pistoleiros mataram a tiros, José Claudio Ribeiro da Silva 54 e a mulher deles, Maria do Espírito Santo 53.

O crime reúne todos os enredos de pistolagem. Ambos foram mortos com vários tiros, provavelmente disparados por espingarda cartucheira e revolver calibre 38, segundo informações preliminares do perito José Augusto Barbosa de Andrade. “Mas só a perícia vai atestar quais os calibres e a quantidade de perfurações”, adianta.

José Claudio e Maria do Espírito Santo foram tocaiados quando passavam numa precária ponte do igarapé Cupu, vicinal Maçaramduba, no Assentamento Agro Extrativista Praialta Piranheira em Nova Ipixuna, distante cerca de 40 quilômetros do centro da cidade.

O casal foi pioneiro na criação desse assentamento, cuja luta iniciou em 1997, inclusive José Claudio liderou a formação deste assentamento composto por 22 mil hectares e atualmente moram famílias.

Eles travavam uma “guerra” contra madeireiros que atacavam sistematicamente aquela região e tentavam impedir a retirada de castanhas do Pará.

No início de junho do ano passado ambos denunciaram à Comissão Pastoral da Terra (CPT), que estavam sendo ameaçados de morte por conta do trabalho de preservação ambiental.

À época, segundo informou o professor Evandro Medeiros, os apelos dos dois ambientalistas encontraram eco na mídia nacional, porém em âmbito regional as denúncias deles caíram no esquecimento, tendo em vista que não houve nenhum inquérito mais apurado para tentar identificar de onde partiam tais ameaças.

De acordo com o coordenador da Comissão Pastoral da Terra de Marabá (CPT), José Batista Gonçalves Afonso as ameaças de morte sequer foram apuradas.

“A história se repete no Pará, nossos companheiros denunciam, não são ouvidos e acabam sendo assassinados”, protesta.

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Nova Ipixuna, Eduardo Ribeiro da Silva reforçou a denúncia de descaso para com o casal de ambientalistas e foi mais além.

“O nosso sangue deve servir para alguma coisa, vai ser preciso morrer quantos de nós para que o Estado tome providência em relação ao desmatamento na nossa região?”, indaga.

Para ele, José Claudio e Maria do Espírito Santo deixam uma lacuna muito grande na luta campesina, porém acredita que os trabalhadores devem se unir para evitar o desmatamento completo do assentamento Agro Extrativista.

Ironicamente o corpo de José Cláudio caiu sem próximo a uma árvore “Caju de janeiro” e uma castanheira, enquanto Maria do Espírito Santo caiu numa pequena moita. Ambos não tiveram a menor chance de se defender.

Os corpos foram encaminhados para perícia no IML e devem ser velados no bairro São Félix e sepultados nesta quarta-feira em Marabá. O casal tinha apenas um filho adotivo de 16 anos e que estudava em Marabá.

José Claudio teveo corpo crivado de balas
Ironicamente, caiu sobre uma frondosa árvore
Pistoleiro arrancou orelha de ambientalista para provar crime
Maria da Silva também foi assassinada impiedosamente
Delegado Marcos Cruz tem missão de esclarecer crimes
Batista: "Estado se omitiu em apurar ameaças" 
José Claudio combatia sistematicamente o desmatamento


A orelha como prova do crime

A Policia acredita que mais de uma pessoa cometeu o crime, sendo que um deles teve o trabalho de se agachar perto do corpo de  José Claudio, tirar o capacete e em seguida cortar parte da orelha direita da vítima.

O corte seria uma prova ao mandante para atestar de fato havia mato o casal. No rastro da morte ele deixou pra trás um capu preto, muito usado por assaltantes de estrada na região.

Um morador daquela região, cujo nome a Polícia optou em não divulgar, disse que viu dois homens numa moto bros, vermelha saindo em alta velocidade em direção à Nova Ipixuna.

Esta moto, de acordo com alguns moradores do assentamento ficou escondida numa mata próxima ao córrego, sendo que os pistoleiros assim com cometeram o crime correram, apanharam o veículo e fugiram rapidamente.

A propósito, segundo diversos amigos do casal, a morte de ambos têm ligação com a luta deles no tocante à preservação ambiental.

Entre esses amigos está o vereador João Batista Delmondes (PT). “Eles eram autênticos defensores da natureza e com certeza quem mandou matar tem interesse em desmatar o assentamento”, sentencia.

Claudelice Silva dos Santos, irmã de José Claudio em princípio falava em ir embora do Pará, porém recuou e disse que vai lutar por Justiça e que a morte de ambos não caia no esquecimento. “A morte do meu irmão não deve ficar impune, queremos justiça”, sentencia.

Igualmente indignada estava a professora Laise Santos Sampaio, irmã da Maria do Espírito Santo. Ela acredita que tais crimes aconteçam porque os pistoleiros e mandantes acreditam que vão ficar impunes.

“Não tem outra explicação, eles matam, ou mandam matar, pois acreditam que vão ficar impunes, mas vamos lutar para que sejam identificados e penalizados pelos crimes que cometeram”, sentencia.

Para se ter uma idéia da dimensão da impunidade quando o assunto é apurar e penalizar os culpados, a CPT cataloga que nos últimos 15 anos, no Pará, aconteceram 205 assassinatos e nas quatro últimas décadas foram assassinados mais de 800 camponeses. “De todos esses crimes não há cinco mandantes presos”, comenta Batista, da CPT.

Delegado tenta desvendar caso

Em princípio a morte do casal de ambientalistas deve ficar sob a responsabilidade do delegado Marcos Camargo Cruz, lotado em Jacundá.
Por enquanto ele preferiu não comentar muito a respeito das especulações em torno do duplo homicídio, porém disse que ambos desenvolviam atividade que contrariava interesses de diversos madeireiros daquela região.
“Não trabalhamos com conjecturas e nem com boatos, mas com fatos que podem se transformar em indícios e suspeitos, portanto é prematuro comentar muito a respeito do caso”, adiantou.
O policial, porém deixou escapar que ouviu de algumas testemunhas alguns nomes de prováveis suspeitos, mas para não comprometer a investigação preferiu não adiantar nada por enquanto.
Nunca é demais lembrar que o casal de ambientalistas, denunciou ao Ibama, em maio do ano passado que madeireiros que estavam derrubando castanheiras.
Por conta dessas denúncias o clima de tensão aumentou no assentamento. Pra se ter uma idéia, quinze dias antes do duplo homicídio, pistoleiros efetuaram alguns disparos na casa deles e acertaram um cão da família.
Outra informação preciosa que a Polícia conseguiu levantar diz respeito a duas ligações telefônicas de números restritos a José Claudio, três dias antes do crime, onde o interlocutor alertava para a possibilidade de ambos serem assassinados.



Casal foi avisado por telefone

O interlocutor aconselhava que ambos não andassem no carro deles, uma courrier branca, placa MWF-3370, Marabá-PA, pois estavam sendo seguidos.


Assim o casal optou em sair de casa numa moto antiga, mas acabou sendo alvos dos pistoleiros que aguardavam pacientemente numa moita à beira do Igarapé Cupu até que conseguiram executar o crime.
Fonte segura do Núcleo de Inteligência da Polícia (NIP) informou a Divisão de Homicídios, deve entrar no caso a fim de auxiliar nas investigações, para quem sabe identificar quem matou e quem foi o mandante.

A repercussão do duplo homicídio
O duplo homicídio do casal de ambientalista gerou repercussão em diversos meios de comunicação. Diversas entidades de direitos humanos e de apoio aos camponeses emitiram notas repudiando os crimes.



NOTA PÚBLICA - REDE FAOR

A Rede FAOR – Fórum da Amazônia Oriental (FAOR) vem a público manifestar sua indignação com o assassinato das lideranças do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), José Cláudio Ribeiro da Silva e esposa  Maria do Espírito Santo, executados nesta quarta-feira (24), no município de Nova Ipixuna, sudeste do Pará. Os dois eram moradores do Projeto de Assentamento Agroextrativista Praia Alta  - Piranheira.

José Cláudio estava marcado para morrer e há muito tempo vem denunciando o desmatamento e a extração ilegal de madeira na região.

Mais uma vez tombam aqueles e aquelas que insistem em defender a floresta.

O FAOR exige publicamente que as autoridades competentes, investiguem este crime com  seriedade e prendam os criminosos (mandantes e executores) para que este não seja mais um crime a fazer parte da imensa lista  de impunidade que assola o nosso estado.

O FAOR aproveita para declarar a sua solidariedade aos familiares das vítimas, ao CNS e reafirmar aqui o nosso compromisso em defesa da vida, da justiça e das populações tradicionais da Amazônia.



CNS condena violência no Campo
O Conselho Nacional de Seringueiro, do qual fazia parte o companheiro José Claudio Ribeiro da Silva e a esposa dele, Maria do Espírito Santo da Silva vem a público repudiar o duplo assassinato e cobrar séria apuração a fim de submeter os envolvidos a júri popular.


A entidade revela ainda que as ameaças contra a vida do casal de extrativistas começaram por volta de 2008. Segundo familiares, desconhecidos rondavam a casa deles,  geralmente à noite, disparando tiros para o alto.

O momento das intimidações coincidiu com a denúncia dos líderes extrativistas contra madeireiros da região, que constantemente avançam na área do PAEX, para extrair espécies madeireiras como castanheira, angelim e jatobá.
Para Atanagildo Matos, Diretor da Regional Belém do CNS, a morte de José Cláudio e Maria da Silva é uma perda irreparável.

“Eles nos deixam uma lição, que é o ideal dos extrativistas da Amazônia: permitir que o ‘povo da floresta’ possa viver com qualidade, de forma sustentável com o meio ambiente”, diz Matos.

“Estamos em contato com o Ministério Público Federal, Polícia Federal e outras instituições. Apoiaremos fortemente as investigações, para que esse crime não fique impune”, afirma o Diretor do CNS.
  
Trabalho - Maria e José Cláudio viviam há 24 anos em Nova Ipixuna.

Integrantes do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), ONG fundada por Chico Mendes, foram um exemplo para toda a comunidade.

Desde que começaram a viver juntos, mostravam que era possível viver em harmonia com a floresta, de forma sustentável.

“O terreno deles tinha aproximadamente 20 hectares, mas 80% era área verde preservada”, conta Clara Santos, sobrinha de José Cláudio Silva.

“Eles extraíam principalmente óleos de andiroba e castanha, além de outros produtos da floresta para sua subsistência. Graças à iniciativa dos meus tios, atualmente o PAEX Praialta-Piranheira tem um convênio com Laboratório Sócio-Agronômico do Tocantins (LASAT – Universidade Federal do Pará), para produção sustentável de óleos vegetais, para que os moradores possam sustentar-se sem agredir a floresta”, revela Clara.

Assentamento - O Projeto de Assentamento Agroextrativista Praialta Piranheira (PAEX) situa-se à margem do lago da hidrelétrica de Tucuruí. Foi criado em 1997 e possui atualmente uma área de 22 mil hectares, onde encontram-se aproximadamente 500 famílias.

Além dos óleos vegetais, o açaí e o cupuaçu, frutas típicas da região, garantem a renda de muitas famílias.
Deputado se solidariza com luta campesina

O deputado Edilson Moura, do PT, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembéia Legislativa chega nesta quarta-feira a Nova Ipixuna onde pretende cobrar apuração do duplo homicídio.
Segundo informações de integrantes do Conselho Nacional dos Seringueiros, em Nova Ipixuna, os dois eram lideranças do assentamento Praia Alta e vinham denunciando, há tempos o desmatamento e a extração ilegal de madeira na região.
Segundo ele, a bancada do Partido dos Trabalhadores vai pedir que a Polícia Federal e o Ministério Público Federal participem das investigações da morte dos dois assentados.
O parlamentar Edilson Moura colocou à disposição da Comissão de Direitos Humanos e pretende acionar as autoridades de Segurança Pública do Estado para que este crime não fique impune.



Morreram tentando preservar a vida



Hoje (terça-feira 24), por volta das 8 horas da manhã, os ambientalistas JOSÉ CLÁUDIO RIBEIRO DA SILVA e a esposa dele MARIA DO ESPÍRITO SANTO SILVA, foram assassinados a tiros no interior do Projeto de Assentamento Extrativista, Praia Alta Piranheira, no município de Nova Ipixuna, sudeste do Pará.

Ambos se dirigiam de moto para a sede do município, localizada a 40 km, ao passarem por uma ponte, em péssimas condições de trafegabilidade, foram alvejados com vários tiros de escopeta e revólver calibre 38, disparados por dois pistoleiros que se encontravam de tocaia dentro do mato na cabeceira da ponte. Os dois ambientalistas morreram no local. Os pistoleiros cortarem uma das orelhas de José Cláudio e levaram como prova do crime.
José Cláudio e Maria do Espírito Santo foram pioneiros na criação da reserva extrativista do Assentamento Praia Alta Piranheira no ano de 1997.

Uma área de 22 mil hectares, onde existia uma das últimas reservas de Castanha do Pará, da região sudeste do Estado. Além da Castanha do Pará a reserva é rica em açaí, andiroba, cupuaçu e outras espécies extrativistas.
Devido à riqueza em madeira, a reserva era constantemente invadida por madeireiros do município de Nova Ipixuna e Jacundá. A área é também pressionada por fazendeiros que pretendem expandir a criação de gado no local.
“Eu defendo a floresta e seus habitantes em pé, mas devido esse meu trabalho sou ameaçado de morte pelos empresários da madeira, que não querem ver a floresta em Pé”, denunciava José Cláudio.

Ele foi o primeiro presidente da associação do assentamento, foi sucedido na presidência da associação por sua espora Maria do Espírito Santo. Os dois ambientalistas eram incansáveis defensores da preservação da floresta extrativista.
Inúmeras vezes interditaram estradas internas, pararam caminhões madeireiros dentro da reserva, anotaram as placas e encaminharam as denúncias ao IBAMA e Ministério Público Federal.

Eram porta-vozes das mais de 300 famílias ali assentadas. Defendiam a floresta como suas próprias vidas. Nos últimos anos passaram a ser ameaçados de morte por madeireiros e fazendeiros.

Por diversas vezes encaminharam denúncias de ameaças sofridas, através da CPT e do CNS, aos órgãos competentes, sempre nominando madeireiros e fazendeiros como responsáveis pelas ameaças.

No final do ano passado, escaparam de uma emboscada, quando pistoleiros estiveram em sua casa procurando pelo casal.

Nos últimos anos, a CPT denunciou as ameaças contra o casal no caderno de conflitos no campo. Nem a floresta nem os ambientalistas foram protegidos pelo poder público.

As castanheiras continuaram sendo derrubadas pelos madeireiros e as duas lideranças tombaram pelas balas criminosas de pistoleiros a mando de seus ameaçadores.

A responsabilidade pelas mortes dos ambientalistas recai sobre o INCRA, o IBAMA, a Polícia Federal que nada fizeram para coibir a extração ilegal de castanheiras na reserva e a destruição da Floresta pelos madeireiros e carvoeiros.

Recai ainda sobre o governo do Estado do Pará que não colocou a polícia para investigar as tantas denúncias feitas por José Cláudio e Maria do Espírito Santo.

Por fim, os dois ambientalistas são vítimas do atual modelo de desenvolvimento imposto para a Amazônia pelos sucessivos governantes, que prioriza a exploração desenfreada e criminosa das riquezas da floresta, em benefício do agronegócio, de madeireiros e mineradores.  As conseqüências são: a destruição da floresta, o saque de suas riquezas e a violência contra seus povos.



José Cláudio e Maria do Espírito Santo vivem na luta e na memória do povo!

                                  

Marabá, 24 de maio de 2011.



Comissão Pastoral da Terra – CPT

Diocese de Marabá

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